Coluna No passo da palavra

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13/04/2017 | No passo da palavra, Colunas - Raquel Ordones

Há poucos dias, na loja entraram mãe e filha, lindas, a filha, cópia fiel da mãe numa versão bonequinha, seis anos talvez…

Já me encantei de cara, ao cumprimentar-me. Atenta a tudo, eu percebia os olhinhos dela percorrer a loja, quase saltando curiosos.

A mãe experimenta uma sandália, clássica em verniz preto; de repente veio a pergunta depois de ouvir a conversa dos adultos:

_Tem vacas de verniz?

E se eu já havia me encantado com aquele ser, agora mais ainda.

Respondi que não, que aquele couro era trabalhado em indústrias especializadas até chegar naquele ponto, e que eles usam várias cores e texturas para deixar o couro bonito para a confecção de sapatos, bolsas, cintos e outras tantas coisas.

Os olhos dela brilhavam como estrelinhas, pareciam contentes com o aprendizado.

A mãe satisfeita com a escolha disse:

_Vou levar essa!

Num ato rotineiro abotoei a fivela que havia ficado aberta ao ser experimentada.

Outra vez a menina:

_Porque você está fechando a fivela se a mamãe vai ter que abrir quando for calçar?

A garota era mesmo um poço de minudência.

Eu disse:

_Poderia deixar abertas as fivelas, mas a estética fica feia, sandália desafivelada tem um ar de descuido. Talvez eu nem soubesse mesmo o que dizer…

Ela fez uma interjeição longa:

_Ahh!

Perguntei:

_ Você já viu como faz uma caixa? Ela disse que não.

Peguei a caixa desmontada atrás do balcão e comecei a dar forma de caixa e aqueles olhinhos dançavam nos movimentos.

Caixa pronta; peguei o papel seda para separar um pé do outro para não se mancharem entre si, finalizando a embalagem, e mais uma surpresa!

Pôs o dedinho num buraco redondo que tinha na caixa e questionou:

_Para que serve isso?

Expliquei a ela:

_ Como o couro já foi vivo precisa respirar, esse buraco é para entrar ventilação evita o cheiro forte e o mofo.

Ela vibrou e já foi logo colocando em prática o que aprendeu:

_Mamãe, quando a gente chegar em casa quero ver se as caixas dos seus sapatos não estão com os buracos virados para a parede, se tiver eles estão sem respirar.

Vendo as duas saírem da loja, me veio Clarice Lispector: “Antes de julgar a minha vida ou o meu caráter calce os meus sapatos e percorra o caminho que eu percorri.”.

Eu nada sabia sobre elas.

As pegadinhas da alma daquela menina ficaram.

Raquel Ordones

Raquel Ordones

Uberlândia - MG – Brasil Administração de empresa / Marketing– setor calçadista Magistério / Contadora de história Poeta / prefaciadora/ orelhista / antologista/sonetista

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